“Sou feito da inteira evolução da Terra; sou um microcosmo do macrocosmo. Nada há no universo que não esteja em mim. O inteiro universo está encapsulado em mim, como uma árvore numa semente. Nada há ali fora no universo que não esteja aqui, em mim. Terra, ar, fogo, água, tempo, espaço, luz, história, evolução e consciência – tudo está em mim. No primeiro instante do Big Bang eu estava lá, por isso trago em mim a inteira evolução da Terra. Também trago em mim os biliões de anos de evolução por vir. Sou o passado e o futuro. A nossa identidade não pode ser definida tão estreitamente como ao afirmar que sou inglês, indiano, cristão, muçulmano, hindu, budista, médico ou advogado. Estas identidades rajásicas são secundárias, de conveniência. A nossa identidade verdadeira ou sáttvica é cósmica, universal. Quando me torno consciente desta identidade primordial, sáttvica, posso ver então o meu verdadeiro lugar no universo e cada uma das minhas acções torna-se uma acção sáttvica, uma acção espiritual”

- Satish Kumar, Spiritual Compass, The Three Qualities of Life, Foxhole, Green Books, 2007, p.77.

“Um ser humano é parte do todo por nós chamado “universo”, uma parte limitada no tempo e no espaço. Nós experimentamo-nos, aos nossos pensamentos e sentimentos, como algo separado do resto – uma espécie de ilusão de óptica da nossa consciência. Esta ilusão é uma espécie de prisão para nós, restringindo-nos aos nossos desejos pessoais e ao afecto por algumas pessoas que nos são mais próximas. A nossa tarefa deve ser a de nos libertarmos desta prisão ampliando o nosso círculo de compreensão e de compaixão de modo a que abranja todas as criaturas vivas e o todo da Natureza na sua beleza”

- Einstein

“Na verdade, não estou seguro de que existo. Sou todos os escritores que li, todas as pessoas que encontrei, todas as mulheres que amei, todas as cidades que visitei”

- Jorge Luis Borges

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Anuncio a minha candidatura a presidente da República



Caros Concidadãos
Caras Amigas e Amigos

Venho anunciar a minha candidatura a presidente da República.

Candidato-me a presidente da República porque é a Hora de não sufocar mais a voz da consciência que no íntimo de cada um de nós aspira a uma Vida plena, desperta e solidária e não à vida estreita e insatisfeita de pessoas que trabalham, produzem e consomem condicionadas por um sistema que começa nas ilusões, medo, letargia, passividade e conformismo das nossas mentes, passa pela cultura oficial de pensamento único e termina nas instituições sociais públicas e privadas. Candidato-me a presidente da República porque entendo que um presidente da República, para além das suas funções constitucionais, deve ser não só um intérprete das aspirações mais profundas da nação, mas também alguém que lhe aponte um rumo colectivo em conformidade com os valores fundamentais da consciência humana e os desafios maiores do momento histórico que vivemos.

Candidato-me a presidente da República porque é a Hora de convocar um debate prioritário acerca de quais os princípios e valores fundamentais que devem presidir à vida económica, social e política de uma nação, no contexto mais amplo da evolução humana e da civilização global. É inaceitável que isto esteja ausente das preocupações da classe política, dos agentes e responsáveis culturais e da comunicação social. É a Hora de denunciar a colonização e intoxicação do nosso imaginário colectivo pelo novo mito, religião e superstição do crescimento económico a todo o custo e pela nova escravatura do trabalhismo, produtivismo e consumismo, que apenas serve para fazer crescer os lucros das grandes corporações enquanto destrói os vínculos comunitários, aumenta as desigualdades sociais, converte a Terra num imenso depósito de lixo, destrói a biodiversidade e os ecossistemas e instrumentaliza e sacrifica as vidas de humanos e animais. É a Hora de dizer basta a um espaço público saturado de economia e finanças, quedas e subidas das bolsas, exaltações e depressões dos mercados, subida e descida do PIB, crises bancárias, tricas partidárias, reivindicações estreitas, mediatismos tontos, famas efémeras, publicidade e consumo ávidos, corrupção, criminalidade, telenovelas e espectáculos de massas para esquecer a futilidade e frustração de tudo isto.

Candidato-me a presidente da República porque - quando vivemos um momento crítico da civilização global, no qual relatórios científicos isentos apontam o risco de um colapso ecológico-social sem precedentes a curto/médio prazo, caso não se inverta já o modelo de uma economia baseada na quimera do crescimento económico ilimitado num planeta com recursos naturais finitos - , é a Hora de assumir como novo desígnio para Portugal, a Europa e o mundo o cuidado da Terra e de todos os seres vivos, na linha da ética global e da ecologia integral – espiritual, social e ambiental - defendidas por grandes vozes da consciência contemporânea, entre as quais a de Agostinho da Silva, do Dalai Lama e do Papa Francisco, na sua última encíclica.

Candidato-me a presidente da República porque, neste momento de nevoeiro, confusão e divisão, é a Hora de repensar seriamente qual o sentido da existência de Portugal como nação e decidir qual o melhor rumo a dar-lhe nesta crise e fim de ciclo de toda uma civilização, na qual se revela o fracasso da União Europeia e novas formas de opressão económico-financeira se instalam na Europa e no mundo. É a Hora de redireccionar a nossa energia colectiva, que desde a expansão marítima anda fora de si em busca de aventura e riqueza material – África, Oriente, Brasil, Europa - , reorganizando de forma ética, saudável e sustentável o nosso espaço externo e interno para servirmos a evolução global da humanidade. Como desde há muito defendo nos meus livros e intervenção pública, é a Hora de actualizar perante os desafios contemporâneos a visão de Luís de Camões, Padre António Vieira, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva, entre outros, da vocação de Portugal para contribuir para um novo ciclo da consciência, da cultura e da civilização, sob o signo da paz, da justiça e da universalidade, que hoje não se podem pensar apenas à escala humana.

Candidato-me a presidente da República porque creio firmemente que Portugal pode e deve, com a qualidade dos seus recursos naturais, energéticos e humanos, despertar para assumir o novo desafio colectivo de ser o mais possível um país ético, saudável e sustentável e uma nação-alternativa, consciente e solidária na relação com todos os povos, todos os seres e a Terra. É deste grande desafio que necessitamos para reunir, regenerar e relançar a nossa energia dispersa, deprimida e alienada.

Candidato-me a presidente da República porque é a Hora de dizer que uma sociedade minimamente sã não é um espaço de alienação, distracção e anestesia, em que predomina a competição por mais riqueza, poder, fama e prazer fugaz, mas antes de reflexão e debate sobre o que verdadeiramente importa, por mais incómodo que seja e questione todas as nossas ideias feitas: o sentido da vida e da morte; a superação do medo, da solidão e do sofrimento; o auto-conhecimento, o desenvolvimento e a realização de todo o potencial humano; o amor, a felicidade, a liberdade e a responsabilidade pelo bem da Terra e de todos os viventes, incluindo as gerações futuras de humanos e animais; a cooperação na criação de condições e estímulos culturais, educativos e sociais para a Vida boa e plena a que todos aspiramos, sabendo que tem de ser ética e solidária.

Candidato-me a presidente da República porque é a Hora de dizer com frontalidade que as mais profundas aspirações humanas pouco ou nada têm a ver com o Portugal superficial e aparente - o Portugal do Estado, das instituições e da burocracia, dos partidos, dos governos e das oposições, dos sindicatos politicamente controlados e da comunicação social manipulada - , que se afunda num marasmo e decadência mentais, sociais e políticos sem precedentes, próprios deste fim de ciclo da civilização globalizada. O mal-estar psicológico e social, o aumento da tristeza, da ansiedade e da depressão (Portugal é um dos países do mundo que mais consome anti-depressivos), bem como dos comportamentos anti-sociais, das dependências e dos índices de abstenção cívica e eleitoral, são o espelho fiel de que as pessoas se sentem infelizes e perdidas na (des)orientação social dominante e não reconhecem na política convencional a mínima alternativa.

Candidato-me a presidente da República porque é a Hora de assumir que desde sempre e cada vez mais existe Outro Portugal, que irrompe por entre as brechas do asfalto do Portugal institucional, como rebentos de ervas primaveris. Esse é o Portugal real e profundo, o Portugal da natureza, das pessoas e de todos os seres vivos, o Portugal das nossas vidas e dos nossos sonhos, o Portugal das alegrias simples e boas de viver, contemplar, criar e amar, o Portugal da dádiva e da partilha desinteressadas, o Portugal das amizades e dos afectos, o Portugal do haver tempo para tudo e da suprema vocação de “poeta à solta” de que falava Agostinho da Silva. Se por um lado este Outro Portugal – na medida em que está preso nas malhas do Portugal institucional, por sua vez metido no colete de forças da política europeia e mundial e dos interesses corporativos e económico-financeiros que a dominam - padece de desespero, revoltas e desenganos, por outro é rico de exemplos, dinamismos e iniciativas que são desde já a diferença que queremos ver no mundo e convergem para uma sociedade, uma cultura e uma civilização completamente diferentes: uma sociedade, uma cultura e uma civilização da consciência desperta, livre e solidária, que reconheça a interdependência de todas as formas de vida e da Terra e se empenhe no seu bem comum.

Candidato-me a presidente da República não propriamente porque queira ser presidente da República. Na verdade não quero ir viver para um palácio, andar num carro de luxo com motorista e polícias à frente, viver rodeado de seguranças e jornalistas e deixar de andar a pé o mais possível, por onde bem entender. Não quero deixar de ser livre e dizer e fazer exactamente o que sinto e penso, seja com quem for e em qualquer situação que seja. Também não quero ganhar mais do que o necessário. Mas candidato-me a presidente da República porque esta candidatura é diferente e não é só minha: esta candidatura é a voz de uma aspiração colectiva que assume a forma de um movimento de consciência, cultural e cívico que visa dar a conhecer, promover e desenvolver o Outro Portugal que já existe, mais ético, saudável e sustentável e que em muitos aspectos funciona melhor que o Estado e as instituições oficiais sem deles depender: o Portugal das iniciativas solidárias e de apoio mútuo, o Portugal das associações humanitárias, de defesa dos animais e ambientalistas, o Portugal de todas as pessoas, grupos e movimentos que em diversas áreas – espiritualidade, cultura, educação, nutrição, terapias, permacultura e agricultura biológica, economia da troca e da dádiva, moedas locais, cooperativas locais de produtores e consumidores, descentralização e auto-gestão, novas formas de organização e intervenção social e política, etc. – já convergem com alternativas para um Outro Mundo que é possível porque já está a ser criado. Este Outro Portugal é inseparável das múltiplas iniciativas afins no vasto movimento planetário que, não limitado pelo artifício das fronteiras nacionais, já converge no mesmo sentido.

Candidato-me a presidente da República porque esta candidatura é simultaneamente um movimento – Outro Portugal Existe – em prol de uma plataforma de pensamento e acção que promova a convergência de todas as iniciativas alternativas, éticas, saudáveis e sustentáveis, criando em Portugal, em conexão com iniciativas convergentes em todo o mundo, um dinamismo mental, cultural e social permanentemente orientado para o Bem comum (abrangente de todos os seres e da Terra). Independente do Estado, dos governos e dos partidos, o movimento Outro Portugal Existe visa fazer desde já acontecer, tanto quanto possível, a mudança que desejamos, sem ficarmos à espera que ela venha por decreto de quem não quer mudar. Esta candidatura e movimento visam catalisar a transição não-violenta para uma sociedade que evolua ao ponto de cada vez mais viver segundo os princípios de Gandhi, que contêm em si todo um programa de acção: sarvodaya (a elevação ou o bem de todos, os humanos, os animais e a Terra); swaraj (auto-governo, no sentido amplo que vai desde a auto-disciplina interior, com uma vida de abundância frugal, até à descentralização do exercício do poder em formas de democracia participativa ou directa e numa sociedade auto-gerida); swadeshi (auto-subsistência das economias locais, com produção e consumo local do necessário, sem visar o lucro, alternativa ao sistema económico dominante e ao seu tremendo impacto ecológico). Esta candidatura e movimento não visam combater o modelo social dominante dentro das suas regras – como o fazem os que o pretendem mudar conquistando o poder e acabando por reproduzi-lo - , mas antes criar, desenvolver e coordenar espaços de vida cada vez mais liberta que, começando por parecer marginal ao modelo social dominante, mostre a pouco e pouco ser este que na verdade é marginal a uma Vida boa e plena. Esta candidatura/movimento não visa por isso converter-se num novo partido político, que por sua natureza é cúmplice e refém do modelo social dominante e apenas promove o carreirismo dos dirigentes e a passividade dos eleitores.

Candidato-me a presidente da República por todos os motivos expostos e em prol de uma mudança de fundo, sabendo que para isso é necessário que ela comece e se aprofunde no íntimo de cada um de nós. Contrariamente ao que desde há séculos se tenta cegamente fazer, piorando cada vez mais a situação do mundo, a mudança social, económica, jurídica e política tem de vir de uma profunda mudança cultural e esta de uma ainda mais profunda transformação da consciência. A grande chave para a resolução de muitos dos grandes problemas do mundo contemporâneo é a redescoberta da espiritualidade, entendida como o despertar fraterno e contemplativo-activo da consciência, que não tem de assumir formas religiosas e pode e deve ser transversal a crentes e descrentes. Para nos libertarmos desde já da nova escravatura do trabalhismo, produtivismo e consumismo, com a consequente e crónica falta de tempo para tudo e agressão constante contra nós mesmos, a Terra e todas as formas de vida, é necessário assumirmos como desígnio pessoal e nacional o reaprender a pura alegria de ser, respirar e viver, aqui e agora, sem estarmos constantemente dominados pela carência e avidez que é o combustível imaterial sem o qual os outros não seriam tão necessários e a economia predadora mundial não poderia funcionar. Se procuramos um paradigma alternativo ao capitalismo, temos de deixar de ter mentes capitalistas, sempre sequiosas de acumular mais, sacrificando os interesses alheios e a harmonia ecológica. Para isso não basta a adesão formal a princípios intelectuais e morais que não se conseguem pôr em prática sem a transformação da mente mediante a prática regular dos métodos contemplativos e meditativos transversais a todas as culturas, cujos imensos benefícios são hoje cientificamente comprovados, no plano do desenvolvimento integral do ser humano, da educação, da saúde e da transformação social. Candidato-me assim a presidente da República para transmitir a mensagem de que Portugal, primeiro que tudo, precisa de mentes e corações mais calmos, pacíficos, felizes, livres, despertos e empáticos, precisa de mulheres e homens mais sintonizados com a sua natureza profunda e mais focados no amor e compaixão incondicionais por todos os seres vivos, pois é daí que podem advir sólidas e duradouras mudanças nas práticas sociais, políticas e económicas.

Candidato-me a presidente da República porque é a Hora de assumir que a política será sempre estreita e medíocre sem a espiritualidade, com a inerente ética altruísta e de não-violência. Esta candidatura e movimento são um projecto de transformação integral e global da nação a partir da transformação interior, são uma iniciativa meta-política de transformação da própria política a partir de uma micropolítica da consciência, pela qual o bom auto-governo geral da nação se enraíze no melhor auto-governo pessoal de cada um pelo melhor de si mesmo, abandonando uma percepção do mundo centrada na ficção de um eu independente e trocando-a por uma percepção do mundo como totalidade interdependente de seres com uma mesma e única aspiração fundamental: uma Vida boa e plena. Candidato-me a presidente da República para exortar à transição do ego para o eco.

Candidato-me a presidente da República não porque tenha soluções claras e imediatas para tudo, mas porque quero ajudar a despertar consciências para a necessidade de juntos as procurarmos e experimentarmos, sacudindo a letargia, a passividade e o conformismo. Assumo esta candidatura/movimento como um processo em aberto de escuta e recolha das necessidades, aspirações e propostas dos cidadãos, das organizações e dos colectivos em prol da constituição de uma plataforma convergente de pensamento e acção que aponte soluções concretas para a reorganização social e económica e o auto-governo colectivo fundadas nos princípios e valores aqui assumidos.

Candidato-me a presidente da República porque sinto e entendo que devo erguer-me e levantar a voz, sabendo que comigo muitas vozes já se erguem e que seremos sempre mais, com a força natural de uma semente que germina, floresce e frutifica.

Candidato-me a presidente da República porque sou politicamente incorrecto e porque é a Hora de dar o meu contributo para que surja em Portugal aquele “indisciplinador” de consciências que Fernando Pessoa disse que precisávamos mais que tudo, bem como aquele “baralhar e dar de novo” a que exortava Agostinho da Silva.

Candidato-me a presidente da República porque, por mais que o espectáculo da política convencional – e sobretudo partidária - me desiluda, como à maioria dos portugueses, sou um idealista, embora com os pés assentes na terra, que acredita que a humanidade tem imensas potencialidades inexploradas de evolução, consciência e amor, desde que nos religuemos à nossa natureza autêntica e profunda, percamos o medo de ser tudo o que realmente podemos ser e abandonemos o apego à segurança que tanto nos prende e limita, mantendo-nos reféns de hábitos e rotinas.

Candidato-me a presidente da República porque sou louco, mas de uma loucura que sei compartilhada pela mulher e pelo homem livres que há no fundo de cada um de nós.

Não tenho nada, nem recursos, nem apoios, nem estrutura e máquina montadas para a recolha de 7500 assinaturas até Dezembro, bem como para a campanha. Esta não é uma candidatura de notáveis e de figuras mediáticas, pois notáveis somos todos nós. Nada tenho, mas conto com as pessoas que estão e que virão e confio no imenso Poder dos sonhos partilhados. Por isso tenho tudo e vou em frente.

É a Hora!

Outro Portugal existe!

Abraços fraternos

Paulo Borges
20 de Julho de 2015

segunda-feira, 13 de julho de 2015

A única alternativa é O Movimento para um despertar global


"(falando sobre as mudanças climáticas) Está cada vez mais claro que o problema central é um modo de produzir cuja principal dinâmica é a transformação da natureza viva em mercadorias mortas, o que causa imensas perdas no processo. O motor deste processo é o consumo - ou, melhor dito, o excesso de consumo - e o motivo é o benefício ou a acumulação de capital; numa palavra, o capitalismo. Foi a generalização deste tipo de produção no Norte, e a sua expansão do Norte para o Sul durante os últimos trezentos anos, o que causou a queima acelerada de combustíveis fósseis como o carvão e o petróleo e uma rápida deflorestação, dois dos processos humanos chaves que estão por detrás do aquecimento global.

Uma forma de considerar o aquecimento global é vê-lo como uma manifestação chave da última etapa de um processo histórico: o da privatização dos bens comuns por parte do capital. A crise climática tem que ser vista, assim, como a expropriação do espaço ecológico das sociedades menos desenvolvidas ou mais marginalizadas por parte das sociedades capitalistas avançadas"

- Jorge Riechmann, Interdependientes y Ecodependientes. Ensayos desde la ética ecológica (y hacía ella), Proteu, 2012, p.293.

As mutações climáticas, o esgotamento dos combustíveis fósseis, dos solos e da água potável, a destruição da biodiversidade e o sofrimento imposto a milhões de seres humanos e não-humanos - com destaque para os animais sacrificados para os lucros da indústria da carne e da pesca - mostram que o actual modelo de crescimento económico é insustentável e eticamente inaceitável e que para salvar a vida neste planeta já não bastam as reformas de cosmética das políticas ambientais governamentais, mas que urge uma mutação profunda de todo o sistema cultural, comportamental e socioeconómico. Depois do aburguesamento, após a segunda Guerra Mundial, da população e dos sindicatos europeus, deslumbrados com o acesso ao consumo e ao suposto conforto material, é um bom e claro sinal da história que cada vez mais movimentos cívicos e sociais, independentes dos sindicatos e dos partidos políticos, coloquem em questão o macrossistema político-económico e o microssistema dos nossos estilos de vida individuais. O que está hoje em causa e em curso não são mudanças superficiais, mas sim uma mutação da civilização, como a história ensina que acontece sempre que mudam os recursos energéticos disponíveis.

Uma das principais razões pelas quais não nos mobilizamos em larga escala e imediatamente, como seria desde já necessário, para evitar as consequências trágicas, a curto prazo, das mutações climáticas, da destruição da biodiversidade e do consumo de carne e lactícinios, é que não há um inimigo externo a combater, pois o inimigo aqui somos nós próprios. Se fôssemos invadidos por uma nação estrangeira ou por extraterrestres mobilizávamo-nos como em tempo de guerra, mas quem se mobilizará contra si mesmo, contra a sua ignorância e hábitos ancestrais, enquanto não sofrer directamente as consequências todavia anunciadas por todos os relatórios científicos? E sobretudo quando a mudança não interessa à economia global de mercado, às grandes corporações industriais e aos governos por elas controlados?

Temo que mais uma vez, como na véspera das grandes Guerras Mundiais, nos encaminhemos para ser vítimas da pior cegueira, a de não querer ver. A única alternativa é O Movimento para um despertar global, que implemente uma mutação radical do modelo de crescimento económico, transitando para uma autocontenção da produção, do transporte e do consumo e para um sistema público de energias renováveis numa economia baseada em recursos e não no lucro. Um ecosocialismo democrático e não antropocêntrico baseado no respeito por todas as formas de vida.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Carta da minha desfiliação do PAN

Caras Amigas e Amigos
Caros Concidadãos

Venho tornar pública, com um sentimento de grande libertação e alegria, a minha desfiliação do PAN, partido do qual fui cofundador e presidente até me demitir em 13 de Setembro de 2013. Lamento ter assistido tão por dentro aos constantes conflitos e lutas internas por poder e protagonismo que devoraram este promissor projecto sobretudo a partir do momento em que obteve subvenção estatal e ascendeu ao limiar de poder eleger deputados a nível nacional. Sem me excluir, e assumindo as minhas muitas falhas, erros e imperfeições, assisti e continuo a assistir a coisas impensáveis num partido que se reclama dos mais nobres e elevados princípios éticos. Desde as eleições legislativas de Junho de 2011, em que estive à beira de ser eleito por Lisboa, até à minha demissão, a direcção e os recursos do PAN viram-se muitas vezes obrigados a sacrificar o trabalho positivo em prol das causas do partido para gerir conflitos causados por uma minoria de filiados que, por serem contrários às decisões dos Congressos, tudo fizeram para destruir o partido com processos e impugnações no Tribunal Constitucional, que se revelaram todos improcedentes.

Mas a cereja no topo do bolo da iniquidade foi posta por um grupo de carreiristas e ambiciosos que, após haverem apoiado estrategicamente a direcção a que presidi nos conflitos referidos, subitamente se voltou contra ela e passou a denegrir o trabalho até então feito para se apresentarem como salvadores do partido e encetarem uma campanha vergonhosa de calúnias, difamações e ataques pessoais a mim, à direcção e às pessoas da minha confiança. Estou de consciência tranquila, pois o trabalho que denegriram e que a minha equipa deixou no PAN foi de um partido credibilizado perante a população, com um crescimento sustentado e resultados eleitorais que observadores externos reconheceram como posicionando-o para chegar à Assembleia da República nas próximas legislativas. Foi precisamente isso que moveu o grupo que tomou o poder, que não hesitou em quebrar a unidade interna que se estava a conseguir para se unir a alguns da minoria antes referida e colocar-se em posição de serem eles a poder escolher-se para cabeças de lista às próximas legislativas, como agora está a acontecer, sem a mínima transparência para com os filiados. A ambição cega destas pessoas não hesitou em criar uma ruptura que, com a minha demissão e recusa de me recandidatar, pois fiquei farto de tanto lodo, levou ao afastamento e desfiliação de muitas dezenas – talvez cerca de uma centena ou mais – de filiados, entre os quais a espinha dorsal da equipa que levou o PAN a tão bons resultados no passado.

Não bastando isto, e como era de esperar, a actual comissão política permanente do PAN – com a cumplicidade da comissão política nacional – tem conduzido o partido num rumo desastroso, desde logo ao entrar com outros partidos numa coligação liderada pelo PS nas eleições para a Assembleia Regional da Madeira, onde sempre tinha tido os melhores resultados e conseguido eleger um deputado em listas próprias, do que resultou a perda desse deputado. Quando antes tinham atacado como lobos a mim e à direcção anterior por resultados supostamente menos positivos do que desejavam, agora não houve a mínima autocrítica e assunção pública de responsabilidades (estrategicamente acabaram com a figura do presidente, diluindo a responsabilidade num colectivo sem rosto). Quanto à orientação política do PAN actual, é óbvio que, apesar do nome Pessoas-Animais-Natureza, se optou por uma colagem quase exclusiva à causa animal e em especial à defesa dos animais de companhia, pois é o que mais fala às emoções imediatas das pessoas e dá mais votos. Salvaguardada a nobreza da defesa dos animais, de companhia e outros (dos quais o PAN menos se ocupa, como os que mais sofrem nas unidades de pecuária intensiva), isto é tanto mais hipócrita e oportunista quando a maioria dos animalistas de raiz abandonaram também o partido e quem lá está nos lugares dirigentes, salvo algumas excepções, não ser propriamente animalista. Com isto, todavia, o PAN está a abdicar de uma proposta global para o país, tendo-se tornado um partido que defende pequenas reformas sectoriais e não um partido, como sempre defendi quando lá estive, que ponha em causa as raízes e a estrutura do sistema. Isto é a meu ver um suicídio político e, independentemente dos próximos resultados eleitorais, o PAN já cortou todas as pernas para andar, reduzindo-se a um pequeno nicho eleitoral do qual jamais passará. Muitas outras coisas poderia referir, como a hipocrisia do actual porta-voz do partido, que no passado me atacou por defender que a promoção da meditação devia fazer parte das bandeiras políticas do PAN, no âmbito do que chamo a política da consciência e com imensos benefícios no plano da mudança mental, da educação e da saúde, e agora vem defendê-la numa entrevista.

Dito isto, e silenciado muito mais, quero dizer que, ao contrário do que possa parecer, não estou minimamente ressentido com o que aconteceu. Digo o que digo apenas por uma salutar indignação e pelo mesmo amor da justiça e da verdade que me levou a ser um dos fundadores do PAN, pois já abraçava as suas causas muito antes do PAN existir. Estou antes infinitamente grato por tudo isto me haver confirmado as razões da reserva e do incómodo que desde o início senti ao estar num partido. Hoje estou convicto que um partido político, seja ele qual for, e com ele o actual modelo de democracia representativa, só estimulam o pior que há em todos nós: por um lado desejo de poder, prestígio e protagonismo, desejo de tachos parlamentares, desejo de poleiro; por outro, passividade e desresponsabilização, esperando que alguém resolva por nós os nossos problemas e limitando a nossa intervenção cívica a um voto de vez em quando.

Portugal, a Europa e o mundo, neste momento de mudança civilizacional, necessitam de outra coisa. Os partidos e a política partidária e convencional são já peças de museu da história. Há outros dinamismos culturais, sociais e cívicos emergentes, há um movimento a surgir, em prol de uma mudança que vem do interior para o exterior e que opera uma nova aliança entre os humanos, os animais não-humanos e a Terra. Há um Poder que está nos nossos corações e nada tem a ver com a luta pelo poder. Há uma capacidade de nos organizarmos para uma Vida boa sem ficarmos dependentes do Estado e dos governos. É aí que estou e sempre estarei. Disto vos darei novidades em breve.

Saudações e abraços fraternos a tod@s!

Paulo Borges

8 de Julho de 2015

terça-feira, 7 de julho de 2015

Ócio e Negócio

Ócio: o que permite ver a cor do céu e sentir os pés na terra. Negócio: o que só faz pensar no que não existe.

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Gratos, Grécia!

Agradeço, estou certo que em nome de milhões de portugueses, aos gregos por terem votado a favor dos nossos interesses e da libertação dos povos dos agiotas da finança internacional! E sinto uma profunda vergonha pelas posições do presidente e primeiro-ministro portugueses, incluindo Portas e António Costa que ficou no habitual nem carne nem peixe, ele que nem consta que seja vegetariano... :) Que o exemplo do povo grego nos contagie a todos e que o amor da liberdade nos levante do túmulo!

sexta-feira, 3 de julho de 2015

Desaprender e reaprender tudo. Deixar de viver mortos. Despertar

Somos uma sociedade que perdeu a alegria de ser, contemplar, criar e amar. Por isso vivemos no frenesim de trabalhar para produzir, lucrar e consumir, no frenesim de nos ocuparmos sempre mais a superar alguém e a fazer mais coisas, no frenesim da busca de estímulos e distracções a todo o custo que nos deixam cada vez mais sedentos e insatisfeitos. É esta a nossa maior violência, contra nós e contra tudo. É ela que está a destruir os nossos bens e recursos mais preciosos, as nossas vidas, o tempo, a Terra, as vidas de todos os seres. É por esta violência que a economia mundial nos devora e o planeta se enche de dejectos industriais, a materialização do lixo interno da nossa avidez insaciável.

Como é ingénuo e ilusório pensar que isto se resolve com medidas externas, jurídicas, políticas ou económicas! Chega de paliativos e manobras de diversão. É de saber viver que necessitamos. Reaprender a felicidade de respirar, de dar um passo sobre a terra, de contemplar o céu, de beber um gole de água fresca, de acariciar um ser vivo, humano, planta ou animal. Reaprender o êxtase de amar toda a expressão da Vida. Desaprender e reaprender tudo. Deixar de viver mortos. Despertar. Aqui-Agora.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

É a Hora de mobilizar a sociedade para o bem comum à margem de Estados, governos e partidos

A (des)União Europeia definha numa guerra de contabilistas, enquanto os povos, os seres vivos e a Terra padecem uma economia da predação ao serviço da ganância das grandes corporações. É a Hora de mobilizar a sociedade para o bem comum à margem de Estados, governos e partidos, de modo a que sejam os Estados, os governos e os partidos que se revelem marginais a uma sociedade auto-organizada. É a Hora de reconhecer que o poder não está nas instituições, mas nas nossas vidas: o poder de ser e de agir com consciência e amor, pelo bem da Terra e de todos os seres vivos. É a Hora de Despertar.

quarta-feira, 1 de julho de 2015

Precisamos de um movimento apartidário e de outro estilo de vida

Uma das maiores armadilhas desta chamada democracia é que as pessoas se habituaram a esperar tudo dos governos e dos partidos e pouco ou nada de si mesmas. A democracia representativa infantiliza e desresponsabiliza os eleitores, que reduzem a sua responsabilidade a delegarem periodicamente responsabilidades noutros que pertencem a corporações de interesses e sobre os quais não têm o mínimo conhecimento nem poder. A democracia representativa é a forma moderna da alienação, do controle e da opressão social. Precisamos de outra coisa. Não de outros governos ou partidos, mas de outro estilo de vida, que passe também por formas de democracia directa e por comunidades locais autogeridas. Precisamos de um movimento apartidário que desperte a sociedade nesse sentido.